segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

À Comunidade Jurídica que participou nas III jornadas : aqui estão as questões técnicas do Tema debatido Insolvência e Recuperação de Empresas. 
Os V. contributos e respostas são bem vindos até à próxima 6º f, dia 16 para o mail anjuristas@gmail.com
 O relatório final será igualmente divulgado por esta via .


III Jornada Jurídica Anjur e VI Jornada de Direito Bancário BCI

8 de Dezembro de 2016
Maputo

Novo regime de Insolvência e de Recuperação de Empresas

Questões Técnicas

O Decreto-Lei nº 1/2013, que entrou em vigor no dia 21 de Agosto do mesmo ano foi um importante ponto de viragem na legislação existente, face à reconhecida ausência de respostas do regime até então previsto no CPCivil . À época, o PIB crescia acima de 7% e era bom o ambiente económico global, o que, junto com o relativo desconhecimento do regime, pode justificar o diminuto número de processos entrados ao abrigo da nova lei. Após o hard landing da economia em 2016, o novo regime será por certo  fortemente solicitado, importando perceber se as suas respostas continuam válidas, em particular, no que toca à Recuperação Judicial (RJ).


1.      Quem ficou de fora do novo regime ?

a)      Implicitamente *, por não reunir os requisitos previstos :

·         - O sector  informal
·         - Os actores formais com contabilidade atrasada

* Nota: o “impedimento” só funciona na posição activa, pois na posição passiva nada exclui a aplicação, embora se anteveja muitíssimo difícil cumprir as exigências processuais;

b)      Expressamente :

·         Empresas públicas e de capitais exclusivamente públicos – al. a) do nº 3 do art 2º; ( o nº 4 prevê um regime especial, até aqui não existente pois a Lei 8/2012 não contém as respostas necessárias );
·         Instituições financeiras – al b) do nº 3 do art 2º ( o regime específico já existe )


2.       O que se exige dos actores económicos ?

Contexto 

- o art 119 do Cód Comercial   impõe a adopção de medidas ao Órgão de Administração em caso de perda de metade do capital social, fazendo-os incorrerem caso de inacção  em responsabilidade civil pessoal para com os credores – artº 164, nº 1 do Cód Comercial;
- não parece existir o dever de apresentação à insolvência pois apesar de no art 102 constar “ O devedor em crise económico-financeira (…) deve requerer ao Tribunal a sua insolvência (… )”, de tal omissão não resultam consequências penais  ( cfr artºs 160 e segs do Cód Comercial, artºs 295 e segs do C. Penal, e art 167 e seguintes da Lei 1/2013 ).
- Não obstante, os actores económicos devem saber quando e como pedir a Recuperação  - judicial ou extra judicial -  e a Insolvência, mais que não seja numa óptica civil de preservação patrimonial.Esta atitude tem de ser proactiva, em vez de, como habitualmente, reactiva ( ou até inexistente ).

Recomendações 

Divulgação/informação  intensiva
apoio de um Orgão do Estado ( IPEME ? ) .



3.      Suspensão da prescrição dos direitos e suspensão das acções e execuções .

É correcta a solução do nº 1º do art 6º;
É  adequado que a suspensão das acções contra o devedor, na recuperação judicial,  só se verifique por 180 dias, improrrogáveis – nº 5 do art 6º  ?
Na insolvência, a sua declaração suspende a prescrição, a qual contudo recomeça a correr com o transito em julgado da sentença de encerramento da insolvência – art 154. É correcto ?


4.      Créditos Fiscais ( AT e INSS ) :

Vazio legal: Falta um diploma regulamentar que defina prazos, regras de parcelamento, eventuais garantias, etc. – artº 48, nº 5 al. b). Quando sai ?

Regime :
- Estes créditos são excluídos da recuperação judicial– art 48, nº 5 al. b)  - ou extra-judicial – art 159º e 161, nº 2 – e são tratados autonomamente.
- execuções fiscais  são suspensas com o despacho de admissão  recuperação judicial  – art 6º, nº 8
- após o despacho de admissão de recuperação judicial pode pedir-se o parcelamento

Problemas :

-  pedido de parcelamento aguarda uma espécie de despacho liminar do Juíz , que não tem em conta o conteúdo, validade, mérito e destino do plano do PRJ (Plano de Recuperação Judicial );
- só pode pedir-se parcelamento num contexto de PRJ ?
- a não concessão do parcelamento pode comprometer o PRJ ;


5.      Ordem da classificação dos créditos
 
A ordem estabelecida no artigo 77 é a mais adequada?
Os créditos laborais devem ter prioridade sobre os com garantias e os fiscais?
A contrário de algumas soluções no Direito comparado, o credor requerente da insolvência não tem qualquer vantagem. Não seria adequado que este obtivesse privilégio creditório especial  pelo seu crédito, ou pelo menos, por uma parte ?

6.      Regime especial para PME´s :

-  Era muito útil que existisse um regime especial para PME´s. O actual limita-se à facilitação de alguns critérios – art 50, al. f) - mas sem diferenças processuais no regime da RJ.  ( aliás, o CPC, fazia esta distinção para as falências – art 1303 e segs – embora as alterações fossem também limitadas, mas  a nível de prazos )
- criar uma divisão no IPEME para apoiar recuperações ?


7.      Administradores de Insolvência :

- Vazio legal : falta diploma legal  com o Estatuto dos AI e regime remuneratório mais claro
- Falta formação adequada



8.      Recuperação Judicial – análise swot

Concepção :  a RJ parece estar orientada para a satisfação integral dos créditos do devedor, decidida num contexto judicial, com espaço para as actuações processuais habituais num processo judicial.   Este modelo funcionará ? Privilegia de facto a Recuperação de Empresas ?


Desafios - vislumbramos os seguintes desafios :

a)      O sistema necessita de profissionais capazes de desenhar planos de recuperação          ( habitualmente, tal não está ao alcance do devedor, apesar de ser de sua responsabilidade fazê-lo – art 52 ; por outro lado, o AI  deve limita-se nestes casos  a fiscalizar a recuperação e o cumprimento do plano );

b)       Medidas de recuperação: O artº 49 deve ser havido como exemplificativo. Mesmo assim , e nem que seja a nível pedagógico, porque prevê tantas medidas e omite as mais comuns, como (i) Hair-cuts (ii) e perdão de juros ? E se nas situações de inexistência de alteração às condições originais do crédito, o respectivo titular nem vota ( art 44, nº 4 ) ?

c)       Excessivamente pesado, lento e  burocrático  - al b) do art 50. Não seria melhor toda a informação contabilística  continuar na empresa, até para garantir a continuidade da escrituração, e  ficar á disposição do administrador que, em prazo curto – por ex, 30 dias – fazia um relatório que juntaria aos autos ?;

d)      O despacho liminar de admissão é dado com base em pressupostos meramente documentais, e a ele segue-se a apresentação do PRJ e a demonstração da viabilidade económico financeira do requerente . A apresentação do PRJ não deveria ser feita conjuntamente com o pedido propriamente dito, o Juiz proferir o despacho liminar de admissão e a Assembleia a sua Aprovação/Rejeição ?

Pontos fortes :  A sujeição à RJ de todos os créditos não estatais do devedor – art 48, nº 1, desde que o plano seja aprovado,  o que facilita bastante a sua exequibilidade e dispensa a necessidade de requer a sua aplicação a credores que votaram contra, como conhecemos de outras jurisdições.

9.      Regime Penal.

Problema : Certamente pelo facto de as iniciativas legislativas terem sido contemporâneas, resultou uma relativa falta de harmonização entre as disposições penais da Lei ( artºs 167 e segs ) e do Código Penal ( artºs 295 e segs ).

Foi acertada a opção de conferir competência ao tribunal que processa a insolvência para processar e julgar os crimes relativos à insolvência e recuperação?

10.   Papel do MP.

A lei prevê – art 4º - a citação do MP em todas os pedidos de insolvência e de recuperação judicial , e a sua intervenção nos actos que envolvam o interesse público ou cuja tutela seja da sua competência . Uma vez que os créditos do Estado foram excluídos, é adequado ?

Se tem a ver com a acção penal – artºs 167 e segs da lei e arts 295 e segs do CP -  não seria o bastante o Juiz ordenar extrair certidões e remete-las ao MP para os fins tidos por convenientes ?

Em que se poderá fundar o recurso previsto no art 57, nº 2, da decisão que conceder a recuperação ?


11.  Sabia que ?

·         O exequente, quando vir devolvido o direito de nomeação de bens à penhora numa execução e ela tenha de prosseguir por não pagamento, pode pedir certidão e com base nela instaurar insolvência contra o devedor ?
·         As obrigações do insolvente podem ser extintas com o pagamento de 50 % – art 155, al b) ? Ou de menos, nos casos da al b) e c) do mesmo artigo, em 5 ou 10 anos, respectivamente, consoante haja ou não condenação pela pratica de crime falimentar ?
·         E que este regime se aplica, a pedido,  ao sócio de responsabilidade limitada – art 157 ?


12.  Sequência  e Acompanhamento :

Após as Jornadas, e tendo em conta os contributos recolhidos, a ANJUR elaborará e publicará pelos meios habituais o RELATÒRIO FINAL das mesmas.

Os promotores ANJUR e BCI propõe-se constituir e dinamizar um GRUPO DE ACOMPANHAMENTO, a preencher por convite e com inclusão de Juizes, Advogados, AI, Gestores e Bancos, cuja missão será a de monitorizar o funcionamento prático deste regime legal e de propor e advogar as melhorias que reputar de necessárias

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