1. Aspectos Gerais que Caracterizam o Mecenato na Ordem Jurídica Moçambicana
O termo
mecenato surge do nome do Imperador Romano Caio Cílnio Mecenas, que durante o
seu reinado defendia a ideia de que o poder necessitava de proteger e financiar
a criação artística.
Na
actualidade, o mecenato é uma forma de patrocínio às Artes, ao Restauro do
Património Cultural, à Educação, à Acção Social, às Letras, ao Desporto e ao
Meio Ambiente, através de benefícios fiscais e sociais concedidos pelos estados
às pessoas jurídicas, sejam elas singulares ou colectivas.
O mecenato em
Moçambique tem a sua consagração legal na Lei n.º 4/94, de 13 de Setembro, e no seu respectivo
regulamento. Estes documentos estabelecem os princípios básicos que permitem
estender a acção das pessoas jurídicas, singulares, colectivas públicas ou
privadas, que desenvolvem actividades lucrativas e que materialmente apoiem no
campo das artes, letras, ciências, educação, saúde, meio ambiente, cultura e
acção social.
Ao
abrigo da lei do mecenato e do seu respectivo regulamento, o apoio material e
financeiro feito pelos doadores ou patrocinadores às Artes, Cultura, Ciência, Acção
Social, Letras, Educação e Meio Ambiente, reveste a forma jurídica de doação ou
liberalidade. Neste sentido, constituem doações no âmbito do mecenato, as
transferências de bens, valores, direitos ou assunção de obrigações com caráter
gratuito e definitivo, por espirito de liberalidade e sem objectivo de proselitismo confessional ou partidário.[1]
De
referir que o objecto da doação no âmbito do mecenato goza de garantia legal de
inalienabilidade e impenhorabilidade sendo livre de quaisquer encargos.[2]
O
ordenamento jurídico moçambicano estabelece como destinatários do mecenato, as
associações e fundações constituídas ao abrigo da Lei n.° 8/ 91, de 18 de
Julho, e as demais entidades publicas ou privadas, singulares ou colectivas,
que sem objectivos de proselitismo confessional ou partidário, prosseguem actividades
sem fins lucrativos e ou que apoiem os seus membros sem fins lucrativos[3].
Contudo,
nos termos da lei e do regulamento do mecenato, as doações não poderão
beneficiar directamente à pessoas físicas ou jurídicas vinculadas a pessoa que
as pratica, deste modo, as liberalidades não podem beneficiar aos
administradores, gerentes, accionistas à data da doação ou nos doze meses anteriores ou posteriores a
liberalidade.[4]
A
impossibilidade de benefício das liberalidades ou doações no âmbito do mecenato
estende-se aos cônjuges, parentes até ao terceiro grau, afins, dependentes e
mais, os sócios não podem beneficiar-se de doações mesmo quanto se trate de
outra pessoa jurídica a conceder a liberalidade.[5]
Deste
modo, afere-se que o mecenato consiste na concessão de incentivos fiscais e
sociais oferecidos pelos Estados às pessoas jurídicas, sejam elas singulares e
ou colectivas que visam patrocinar, através
de liberalidades ( doações e patrocínios) ao Restauro do Patrimônio Cultural, à
Arte, à Acção Social, ao Meio Ambiente, à Educação, à Saúde e ao
Desporto.
1.1. Incentivos Fiscais e Sociais
Para Efeitos do Mecenato na Ordem Jurídica Moçambicana
O
Estado moçambicano confere vantagens ou incentivos de natureza fiscal e social[6] aos
doadores, patrocinadores e ou às entidades que pratiquem liberalidades nos seguintes termos:
1.1.1. Benefícios/incentivos
Fiscais
Nos
termos da lei do mecenato e do seu respectivo regulamento, tendo em atenção o
Código de Imposto sobre Pessoas Colectivas, o doador poderá deduzir como custo
ou perda do exercício para efeitos da determinação da matéria colectável os
montantes doados[7], não
pagando, assim, sobre eles, IRPC.
É
de esclarecer que, para efeitos da incidência do IRPC ( imposto sobre o
rendimento de pessoas colectivas), são considerados custos ou perdas do
exercício, os donativos em dinheiro ou em espécie, concedidos pelos contribuintes
até ao limite de 5% (cinco porcento) da matéria colectável do ano anterior, se
as entidades beneficiárias forem associações, fundações constituídas nos termos
da lei e no regulamento da lei das associações, e demais entidades públicas,
privadas, singulares e/ou colectivas que sem fins de proselitismo confessional
ou partidário desenvolvam actividades sem fins lucrativos. Contudo, se o
beneficiário da doação for o Estado, a lei não impõe o limite de 5% para
efeitos de dedução como custo ou perda à matéria colectável para efeitos do
IRPC[8].
Vejamos
o processamento do facto acima exposto com base nos exemplos a seguir:
1. A empresa X tem o saldo contabilístico anual de 5.000.000,
00 Mts (cinco milhões de meticais), desse valor, cobre as despesas anuais no
valor de 2.500.000, 00Mts (dois milhões e quinhentos mil meticais) e doa ou
patrocina a uma fundação ou associação o montante de 125,000, 00Mts (cento e
vinte e cinco mil maticais) correspondente aos 5% (cinco por cento) do valor
liquido remanescente, neste caso, os 5% (cinco por cento) serão deduzidos como
custo ou despesa, logo, a matéria colectável será de 2.375,000 00Mts (dois
milhões, trezentos e setenta e cinco mil
maticais), sobre a qual incidiram os 32% correspondentes ao IRPC, deste modo, o
IRPC da empresa será de 760,000,00 Mts (setecentos e sessenta mil meticais).
De salientar que, este benefício fiscal não impede o
benefício social na forma de publicitação das actividades desenvolvidas pelo
patrocinador ou doador, acto que possa concorrer para a redução dos custos
relativos ao marketing e também, poderá a empresa, ser ilegível e com vantagens
comparativas para efeitos de concurso público.
E mais, estes
incentivos podem ser adquiridos de forma comulativa pela empresa que pratica as
liberalidades previstas na Lei do Mecenato.
2. Caso a empresa não doe, tendo o mesmo saldo
contabilístico, os mesmos custos e o mesmo lucro, sem beneficio dos 5% deduzido como custo, para efeitos de
incidencia do IRPC, irá pagar o IRPC de 800,000,00 Mts (oitocentos mil meticais)
que incidirão dos 2.500.000.00Mts (dois milhões e quinhentos mil meticais) da
materia colectavel ou lucro.
De referir que, as empresas que não praticam
liberalidades no ambito da Lei do Mecenato, não se beneficiam de nenhum incentivo fiscal ou
social, o que irá acrescer os custos relativos ao marketing do seu produto e,
não se beneficiarão das vantagens no âmbito da contratação pública dos serviços privados que uma empresa que
pratica liberalidades no âmbito da Lei do Mecenato se beneficia.
1.1.2.
Dos Procedimentos
As
liberalidades praticadas (doações e patrocínios) serão comunicadas por escrito
ao beneficiário e às entidades governamentais
que tutelam as áreas em questão, podendo, contudo, as entidades
referidas mandar certificar a conformidade
da liberalidade[9].
Os
beneficiários devem igualmente comunicar ao Ministro das Finanças e ou Direções
Provinciais das respectivas áreas, os
bens ou valores recebidos para efeitos
de confirmação dos benefícios fiscais a conceder aos beneméritos.[10]
A
entrega das liberalidades deverá ser feita com a presença obrigatória de um
representante da entidade governamental que tutela a área beneficiada que por
sua vez, rubricará o termo de entrega.[11].
De
salientar que, os beneméritos só terão direito aos benefícios fiscais se
declararem expressamente que a liberalidade ( doação e Patrocínio) é irreversível.[12]
1.1.3.
Tratamento Fiscal das Pessoas Jurídicas Constituídas e com domicilio no
Estrangeiro que queriam praticar alguma
liberalidade no âmbito do Mecenato
A lei moçambicana não se refere aos benefícios
fiscais que uma entidade estrangeira possa ter ao conceder uma liberalidade ( doação
e patrocínio) a um ente constituído e com domicilio em Moçambique, cabendo à
mesma, verificar se as disposições que regulam o mecenato no seu território nacional prevê ou não algum incentivo fiscal aplicável
no âmbito do mecenato.
1.1.4.
Quanto as ONGs Estrangeiras Sem Domicilio e com Domicilio em Moçambique.
A
ordem jurídica moçambicana não imputa em regra o IRPC a ONG´s, limitando-se a
conceder autorização prévia ao exercício de actividades, pelo Ministério dos
Negócios Estrangeiros, e a exigir o seu registo, na Autoridade Tributária.
Deste
modo, as ONGs, sejam elas nacionais ou estrangeiras não são sujeitos do IRPC.
Assim sendo, as liberalidades que praticam no âmbito do mecenato, não estarão sujeitas
aos parâmetros aplicáveis aos demais sujeitos passivos de IRPC .
Quanto
ás entidade beneficiarias, á partida e
previsivelmente, elas próprias não são sujeitas a IRPC ou IRPS, não incidindo
nenhum imposto sobre o bem ou valor recebido no âmbito do mecenato.
2. Benefício Social
Ao abrigo da lei e do
regulamento do mecenato, as entidades que praticam liberalidades beneficiam-se
de incentivos sociais, nomeadamente: menções honrosas, diplomas de mérito,
publicitação de tais actos nos órgãos de informação pelos beneméritos,
realização de espectáculos culturais e desportivos gratuitos destinados aos
beneméritos[13].
Estes incentivos,
certamente conferem vantagens comparativas às empresas que praticam as
liberalidades no âmbito da lei do mecenato relativamente às empresas que não
praticam liberalidades no âmbito da mesma lei.
Quantos as entidades
nacionais e estrangeiras, podem beneficiar de incentivos sociais no âmbito da
lei do mecenato. Os referidos benefícios, serão extensivos às Organizações Não
Governamentais, sejam elas nacionais e /ou estrangeiras.
3. Conclusões
Notou-se
claramente que o IRPC da empresa que pratica liberalidades é relativamente
reduzido que o IRPC da empresa que nada doa ou não pratica nenhuma
liberalidade, e mais, além dos beneficio fiscal, as empresa que doam, gozam de
incentivos sócias, por exemplo, podem ver as suas actividades publicitadas
pelos beneficiarios sem que incorram a nenhum custo,
podem ganhar diplomas de honra o que lhes pode garantir o caracter preferencial no âmbito da contratação publica
dos serviços privados.
Verificou-se
que, tratando de um ente estrangeiro sem sede em Moçambique, a conceder alguma
liberalidade a um ente devidamente constituído em Moçambique, a lei moçambicana
não estabelece naturalmente nenhum incentivo fiscal no âmbito da lei do
mecenato, contudo, o ente estrangeiro poderá eventualmente beneficiar-se, no
País da sua sede, caso haja previsão nesse sentido.
Legislação Aplicável ao Mecenato
· Lei n.º 4/94, de 13 de Setembro, (Lei do Mecenato) que estabelece os princípios básicos que permitem estender a acção das pessoas jurídicas singulares, colectivas públicas ou privadas, que desenvolvem actividades ou financeiras e materialmente as apoiem no campo das artes, letras, ciências, cultura e acção social;
· Decreto n.º 29/ 98, de 9 de Junho, aprova o Regulamento da Lei n.º 4/ 94, de 13 de Setembro (Lei do Mecenato);
· Lei n.º 15/ 2002, de 26 de Junho, que Estabelece os Princípios de Organização do Sistema Tributário.
· Lei n.º 34/2007, de 31 de Dezembro, aprova o Código de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas.
Lei n.º 8/ 91, de 18 de Julho, Lei das Associações.
· Decreto n.º 55/98, de 13 de Outubro, Cria o Quadro Legal que Define os Critérios da Autorização, Objectivos a Atingir e Mecanismos da Actuação das Organizações Não Governamentais Estrangeiras.
[2] N.° 2 do artigo 7 do Regulamento da Lei do
Mecenato.
[3] Artigo 8 da
Lei do Mecenato.
[4] Artigo 7 do
regulamento da Lei do Mecenato.
[6]Artigo
8 do Regulamento da Lei 4/94, de 13 de Setembro ( Lei do Mecenato)
[7]Artigo
8 da Lei do Mecenato, conjugado com o artigo 8 ,9 e 10 do seu Regulamento com
atenção ao disposto no artigo 34º do
Codigo de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas.
[8]Artigo
6,7,8 da Lei do Mecenato conjugado com os artigos 10 do Regumento da Lei do Mecenato, com atenção
no previsto pelo artº 35 do Codigo de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas
Colectivas
[9]Artigo
5 do Regulamento da Lei do Mecenato
[11] Idem b.
[12]N.°
3 artigo 9 do Regulamento da Lei do Mecenato.
[13]Artigo
9 do Regulamento da Lei do Mecenato